quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

A QUESTÃO DA LEI DA ANISTIA (3)

ARGUMENTOS À DIREITA

O coronel reformado, Carlos Alberto Brilhante Ustra, o temido "major Tibiriçá"; apontado por muitos como pessoalmente envolvido com a tortura no DOI de São Paulo, que comandou no início dos anos 70. Uma ação movida por ex-militantes de esquerda o desenterrou do ostracismo do qual nunca deveria ter saído: escreveu um livro com a sua versão dos fatos e mantém o site homônimo"A Verdade Sufocada" (link AQUI). Resta saber se foi "sufocada" por afogamento ou saco plástico...


Terceiro e penúltimo da série (leiam os anteriores AQUI), esta postagem pretende analisar alguns  argumentos utilizados por setores conservadores para se contrapor à tese da "revisão" da lei da anistia. Se no caso da esquerda concordo, em boa parte, com os argumentos mas discordo das conclusões; agora ocorre quase o contrário: concordo com as conclusões mas divirjo (radicalmente, em alguns casos) dos argumentos. Seguem trechos de artigos do jornalista Reinaldo Azevedo, comentados por mim em vermelho.


A tese da simetria torturadores versus "terroristas"
"Parece que, dada a Constituição, se cabem ações para punir os acusados de tortura, então está dado o caminho para fazer o mesmo com os acusados de terrorismo. 'Ah, mas aquele não era um estado democrático'. Fato. Mas havia uma ordem constitucional." (íntegra AQUI)
Existir uma "ordem constitucional" não pode ser aceitável como argumento que nivela as partes: seria como condenar judeus por cometerem atentados contra o regime nazista. Mas o mais importante é que; mesmo não sendo legítimo o exercício do poder, afinal obtido à força, boa parte de suas ações só foi possível através do uso de instrumentos de exceção: os Atos Institucionais. Não são simétricas as partes quando uma delas pode mudar as regras do jogo...
E ainda: os agentes públicos que perpretaram ilegalidades ou crimes tinham a cobertura do aparato de Estado, estavam protegidos de retaliações judiciais.


O caráter da "Comissão da Verdade"
"Ainda que houvesse sentido jurídico na revisão da Lei da Anistia e que os torturadores de então - ou seus colaboradores e/ou incentivadores - pudessem ser chamados ainda hoje de torturadores (dada a imprescritibilidade do crime), eles não poderiam ser julgados por um tribunal político composto de TERRORISTAS. Se é verdade que um torturador será torturador para sempre,  então um terrorista será terrorista para sempre. E estes não podem julgar aqueles. Não fosse a ilegalidade descarada dessa tal Comissão da Verdade, não fosse a sua flagrante inconstitucionalidade - e isso não é, reitero, matéria de gosto, mas de fato -, há, repito, a questão que é de fundo moral: quem aderiu ao terrorismo não julga quem aderiu à tortura." (íntegra AQUI)
O jornalista exorbita do bom senso e dá à eventual Comissão poderes que ela nunca teria: o judiciário continuaria funcionando. Além do mais, "tribunais de exceção" eram as cortes militares que julgavam os pretensos "terroristas" no passado.


A "ditabranda"
"Comparar as chamadas vítimas da “ditadura militar” brasileira com os horrores cometidos na Argentina ou no Chile é arte da trapaça histórica. A população chilena corresponde a menos de um décimo da brasileira, e se estimam em 3 mil os mortos pelo regime de Pinochet. A ditadura argentina matou 30 mil (!!!) pessoas para um quinto da nossa população. No Brasil, os mortos, dando crédito a tudo o que dizem as esquerdas, somam 427. Não! Não estou achando que é pouca gente. Mas aí se encontram tanto os que morreram de arma na mão quanto os que foram vítimas da brutalidade do estado. De todo modo, resta evidente que se trata de processos diferentes. Como diferente foi a transição da ditadura para a democracia. Os militares brasileiros foram infinitamente menos brutais do que seus pares latino-americanos e também muito mais políticos." (íntegra AQUI)
Os regimes ditatoriais de direita na América Latina, nos anos 60 e 70 foram, obviamente, produtos de um mesmo processo histórico e inclusive se ligaram de fato, como foi o caso da Operação Condor. Segundo dados oficiais cerca de 50 mil pessoas foram detidas no Brasil; acredita-se que  20 mil delas foram torturadas; cerca de 400 mortas ou desaparecidas. Acredita-se ainda que cerca de 24 mil estiveram envolvidas nas ações de repressão e 300 diretamente com a tortura. Branda? Ainda que apenas uma pessoa sofresse com o arbítrio não mudaria a natureza do crime...


Como se pode perceber são pobres os principais argumentos usados pelo pensamento conservador: não são simétricas as relações entre os dois grupos; a ditadura brasileira torturou e matou; e, colocar o tema em debate não desobedece a nenhuma lei ou princípio ético. No entanto concordo com o jornalista quando diz "que a anistia foi um processo de pacificação política. Anistia não é julgamento ou atestado de inocência." Assim haveria que, respeitando os efeitos da lei da anistia, revisar as questões morais e éticas daquele período e, pedagogicamente, registrá-las no arcabouço institucional.

E só. Todo o restante do debate resume-se à apresentação de listas de torturadores e "terroristas", de lado a lado. Neste particular a contribuição do jornalista equipara-se ao de grupos como o "TERNUMA" (link AQUI) ou do coronel acima retratado. Digamos que os argumentos tenham sido torturados...

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9 comentários:

  1. Os argumentos à direita terminam aqui?

    :D

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  2. Bem, eu li uns 7 ou 8 artigos do Reinaldo Azevedo sobre esse tema. Espremendo é o que sobra, fazer o que...

    Se houver interesse dos ilustres leitores desse chalezinho (e paciência do seu autor) ainda volto ao assunto - e, nesse caso, deverei abordar de novo as principais teses de lado a lado -, em uma última postagem, na qual pretendo dar pequena contribuição da minha modesta lavra.

    A tese é que o país não pode ficar refém de Vannuchis e Brilhantes Ustras. Não são estas pessoas as indicadas para propor rumos e saídas...

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  3. Sabe... eu, como o presidente que o assinou, ainda não li o tal III Programa Nacional de Direitos Humanos, essa sopa de letrinhas num caldeirão (prá alguns)ameaçador...rs.

    Mas o melhor disso tudo é a discussão sugerida.

    Assim, vou aguardar a última postagem da modesta lavra do ilustre blogueiro... :p

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  4. Putz, amarelou de novo... rss

    Fique tranquila, nega, esses milicos de pijama não põem mais medo em ninguém...

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  5. Vixe, vou saindo de fininho pra mode de não ter insônia!!
    Amanhã eu vorto... assim eu espero!! Tomara, né?? rs
    Confesso que este assunto me entedia... rs ( mas juro que tentarei tecer um comentário à altura de tão ilustre e bem feita postagem!! )
    Bj em ti, migo intiligente pra dedéu! rs
    Helô bocejando!! rs

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  6. Ei Helô,
    a mim também não dá prazer; abordo esses assuntos apenas por uma espécie de obrigação moral...

    Aguardo seu comentário e tenho certeza de que será inteligente como todos o são...

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  7. Extremo poder de concisão que minha pregui... agradece!
    Seu estilo está, a cada post, mais definido: "Resta saber se foi "sufocada" por afogamento ou saco plástico..." é de um sarcasmo refinadíssimo que seria cômico se não fosse trágico, né? ...e encerrar com "Digamos que os argumentos tenham sido torturados..." resume de forma bastante arguta a opinião do jornalista (claro que isso é um trabalho jornalístico, dos melhores!).
    Também vou "amarelar" (se você quer chamar assim) como a querida amiga Cora, estou aguardando o próximo post e dou a maior força prá que você volte, sim, ao assunto.
    thanks much pela sua responsabilidade moral!

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  8. Ei Udi,
    agradeço muito o generoso elogio: sei que não o mereço...

    Olha, as pessoas responsáveis parecem ter perdido o bom senso: como deixar esta questão na mão de radicais de direita e esquerda? Bem, acho que há saída para o imbróglio, mas sem essa gente dando pitaco...

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  9. O que me causa revolta é o fato de pessoas como Vitoria Grabois - Vice Presidente do Grupo Tortura Nunca Mais estar pleiteando uma alta soma pela desaparecemento de seu companheiro Gilberto Olimpio, guerrilheiro em Araguaia e ainda uma pensão por toda vida, baseando-se em falso atestado de que o falecido seria Jornalista. Acoonte que o jovem guerrilheiro, nunca passou síquer em porta de Jornal, nem muito menos Faculdade de Jornalismo e o mais grave, a pleiteante já recebeu vultuosa soma, alegando q. seria para seu filho... Não se chama tal procedimento de Crime por falsidade ideológica? Por essas e outras fica desacreditado a Comissão de Anistia...

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