Grosso, bronco, troglodita, cintura-dura, botineiro, escorpião... Ok, ok, estes são apenas alguns dos nomes (dos publicáveis) pelos quais costumo ser chamado. Parece, inclusive, que a lista foi acrescida recentemente (vide comentários do post anterior). Mas como dizia Caymmi, também tenho meu "momento na vida", também sei (juro!) apreciar o belo. Atualmente tenho me encantado pela chamada "literatura feminina".
A bem da verdade, sequer sabia que havia esta denominação, por gênero. Sim, sempre soube que os homens publicaram muito mais, do mesmo modo que tiveram maior participação em vários outros aspectos da vida social. Mas sempre atribuí a fatores culturais, não propriamente de gênero. O fato é que parece haver, inclusive, acalorado debate acadêmico sobre o tema. Ademais, formam-se grupos de escritoras, especializam-se editoras e prateleiras de livrarias, criam-se blogs... Elas querem falar e, mais precisamente, escrever.
Algumas análises apontam atributos comuns ao que se vem chamando de literatura feminina, como temática, linguagem e estilo próprios, caracterizando uma escrita nitidamente feminina. Segundo a ensaísta Vera Queiróz são femininos "os textos que apresentam determinadas marcas, que percorrem o campo semântico de falta, silêncio, indizível, confessional, subjetivo, íntimo, prevalência do eu-narrador, visão interior, esgarçamento do sentido da palavra e da ordem do discurso, dilaceramento da escrita, busca da identidade, descontínuo, atópico, atemporal, extático." No mesmo sentido, destaca Mauro Rosso: "fragmentação narrativa, intertextualidade, foco narrativo múltiplo, exploração dos mitos, do esotérico e linguagem do corpo." (quem quiser ler uma boa resenha sobre o tema, clique aqui)
Pretendo iniciar uma série com textos de escritoras, preferencialmente inéditas, que creio merecedores de atenção e escolhi, para inaugurar esse label, a escritora Eliana Mara. "Baiana" nascida em Sampa, 45 anos, doutora em Literatura e Cultura pela UFBA (da qual também é professora titular), divorciada, dois filhos e um neto. E centenas de textos publicados na web, nos quais é possível identificar várias daquelas (senão todas) características sublinhadas pelos especialistas, além de um punjente lirismo.
Ah, apenas por coincidência, ela é uma bela mulher e minha amiga. Com vocês, Elianinha!
MÃES
Eu disse, vociferando: Puta que o pariu. Ele me questionou, com o punho ameaçando um soco: E se eu te disser que minha mãe não é uma puta. Eu, com vontade não de apanhar, mas de morrer, respondi: Vai ficar o dito pelo não dito. A lojinha era escura. Eu entrei ali para comprar envelopes. Ele entrou ali para me roubar. Ele era muito alto. E eu, sempre pequena. Eu inclinei a cabeça para o alto, e nossos olhos se encontravam numa linha oblíqua. Ele me dava sinais de que havia uma arma. Eu decidi dizer tudo que me passava pela cabeça: você quer a minha bolsa, o meu dinheiro, os meus cartões, e eu vou esfregar isso tudo na sua cara, você quer me humilhar porque você é grande e hoje é meu dia de não aceitar mais humilhações, eu estou no meu limite, entendeu, e pode usar esta arma e usa agora, porque agora, antes de eu colocar essa carta definitiva no correio, é a melhor hora para morrer, e eu não tenho medo da sua altura, nem da sua faca, nem do seu revólver, eu quero que você me mate e me mate agora mas pára de encher meu saco e eu não vou gritar chamando a polícia porque a polícia me dá nojo, e eu acho que você pode me fazer este favor porque a sua eu não sei, mas a minha mãe é uma puta e eu quero que ela vá pra puta que pariu e leve todas as mães e avós deste mundo e leve junto todas as pessoas grandes que me ameaçam e eu só estou esperando, atira. Ele não atirou, ele não pegou a bolsa, nada. Ele saiu, a vendedora, agora sem cor nenhuma, me elogiou: nossa, que coragem a senhora tem. Eu olhei para a moça fraca que ela era e disse: vá pra puta que pariu você também. Sorte sua eu não estar armada.
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Vamos por partes:
ResponderExcluir1) grosso, botineiro? São homens que chamam você assim, não? Talvez você mesmo tenha aberto a porteira, ao se definir “meio-cafa, meio gentleman”... Mas não, sabemos que sua parte cafajeste é a porção que as mulheres gostam. A parte cavalheiro, então...
Eu diria: certeiro, afiado, assertivo, inteligente, franco. Boas características, nem sempre bem compreendidas, né? Então, como diz a Elianinha, vão pra puta que os pariu! rsrs
2) literatura feminina? Não sou doutora, respeito os doutos aqui citados, mas não creio que necessariamente mulheres façam textos com características de “literatura feminina”, como as listadas... Conheço uns machos que o fazem muito bem. E me incomoda um pouco uma classificação literária por gênero, sabia?... Mas, tudo bem.
3) Eliana Mara. Ela não é a mais baiana das paulistas, é a mais paulistas das baianas, o que só agrega qualidades às muitas qualidades da gente caymmi. Boa de texto e boa de papo, professora de mão cheia. Muito boa sua escolha, Erreeme!
Grande beijo!
Filó,
ResponderExcluir1) A gerência, penhorada, agradece o simpático e generoso comentário.
2) A mim também não agrada, acho meio forçado. Mas inevitável reconhecer que as tais características, de fato, se apresentam. No caso da Elianinha parece uma radiografia.
Tirando as questíunculas acadêmicas, toca-me mais o conteúdo que propriamente a temática e o estilo. E aí me parece (feeling puro) que há novidades, provavelmente relacionadas a uma nova mulher, que se apresenta aos poucos.
3) Suspeito demais para falar, pra mim a baianinha é top e a publicação de sua poesia ou prosa poética é mera questão de tempo.
Improvável jeito de ser segunda-feira:
ResponderExcluirAqui em Salvador é feriado. Dia dos comerciários. Não pude sair para as lojas, a cidade está bem quieta. Não fui para a praia e tive uma sessão no
dentista (sem dor!).
Cheguei em casa e entrei aqui e me deparo com este presente, esta delicadeza, esta dádiva, indescritível.
Rm, você sempre fez parte da minha trajetória de escrita no Mundo, porque sempre, sem falhar um dia, esteve presente, além das conversas
amigas, nos bastidores, me dizendo sempre para seguir, me provocando, me dando força.
E Filó é uma escritora também, uma mulher que eu aprendo diariamente a admirar.
Sorte minha ter estado com vocês dois juntos, numa bela noite nas montanhas gerais.
Ainda não sei lidar com os elogios à minha escrita e isso não é uma questão de modéstia falsa ou verdadeira. É apenas a sensação de que a escrita me escolhe. Simplesmente não posso deixar de escrever.
E hoje, RM, você, que o cafajeste mais lírico que eu conheço, me dá uma alegria que não posso descrever. Mas que levo para sempre no coração!
E como diz Clarice, hoje estou no dia de ser piegas! Com todo o direito a isso!
Oi, RM:
ResponderExcluirTambém não acredito em literatura feminina, caso contrário teria que existir a literatura masculina, a guei, a lésbica, sem contar as outras opções sexuais que existem por aí... rs rs rs
Mas também acho que a blogosfera está abrindo um campo novo para que talentos venham à tona. Antes, algumas dessas mulheres gostavam de escrever diários íntimos. Hoje elas postam em blogs.
Só acho que muitas dessas talentosas têm o péssimo hábito de se esconderem atrás de pseudônimos ou codinomes ou apelidos, não sei por quais razões -- talvez seja por timidez ou algo semelhante --, e isso dificulta a divulgação dos seus talentos.
Sei que não é o caso da Eliana, mas com toda certeza você incluirá nas suas indicações outras dessas camaleoas que praticam o mimetismo virtual. Existe isso? Mais rs rs rs
Boa crônica, a da Eliana.
Abraços,
MR
20/10 - 14:23
Ôps, faltou um pedido de explicação: quer dizer que a Eliana já se encontrou com você e com a Filó aí nas montanhas, há algum tempo? É isso mesmo?
ResponderExcluirPensei que tivesse sido com você e com a Lu G. Para mim, a Filó era carne fresca... rs rs rs
Você é um grande sacana, mesmo, além de ser um escorpião dos mais venenosos... Fica escondendo o jogo!
Então, como eu expliquei a ela outro dia, "segundão qualquer coisa aí!"
Mais e mais rs rs rs
Abraços,
MR
20/10 - 14:27
Ôps, faltou um pedido de explicação: quer dizer que a Eliana já se encontrou com você e com a Filó aí nas montanhas, há algum tempo? É isso mesmo?
ResponderExcluirPensei que tivesse sido com você e com a Lu G. Para mim, a Filó era carne fresca... rs rs rs
Você é um grande sacana, mesmo, além de ser um escorpião dos mais venenosos... Fica escondendo o jogo!
Então, como eu expliquei a ela outro dia, "segundão qualquer coisa aí!"
Mais e mais rs rs rs
Abraços,
MR
20/10 - 14:27
rm
ResponderExcluirTambém eu, de vez em quando, cedo espaço no meu blog para textos de amigos. É muito bom para variar e diversificar, não? E acho que você não poderia ter escolhido uma autora melhor. Dos tempos que freqüento a Internet, não encontrei textos mais belos e criativos que os da Eliana Mara. Parabéns aos dois pelo presente nessa segunda-feira chuvosa aqui no Rio de Janeiro.
Tenham todos uma excelente semana
Olá meu querido!
ResponderExcluirGrosso? Quem teve a ousadia?
Amo "women writing". E indico duas poetas gringas: Sylvia Plath e Elizabeth Bishop. Esta última viveu muitos anos em Ouro Preto e dizem as más línguas que deixou uma certa paixão por lá... Fofocas literárias, enfim!
Gostei da Eliana Mara. Vou ler mais. Vou pesquisar mais.
Um super bjo para vc! Obrigada pela minha defesa no blig da Ana! rsrsrs
Malu - carinhosamente "menina maluquinha" by RM
Elianinha,
ResponderExcluirmas não tinha nem um café aberto?
Não, não... não estou insinuando nada a respeito da conhecida disposição para o trabalho dos baianos... rsss
Querida, presentes são seus textos, de uma poesia e lirismo tão raros hoje em dia.
Dom Marcos Rocha,
ResponderExcluircuriosos esses movimentos causados pela web: ao mesmo tempo em que democratizam sobremaneira o acesso à mídia; escondem, através da compartimentação e atomização, o que ela tem de melhor.
O fato é que não há Elianas dando sopa a cada clique e achá-las não é muito fácil, como não seria se não houvesse internet.
Por outro lado, mais e mais mulheres, que talvez não tenham o mesmo talento da Elianinha, mas que escrevem muito bem, se arriscam e publicam seus escritos na web. Este é um fenômeno que me chama a atenção desde a primeira vez que circulei por aqui.
Aceito sugestões.
Sobre a Filó, além de ser também muito talentosa, só sei que tem uma barriguinha encantadora.
Da Luciana G, apesar de termos nos encontrado algumas vezes, não foi possível checar esse atributo... rsss
Preciso parar com esse bordão de "segundão qualquer coisa aí": quase falei isto, outro dia no blog da Beth... rsss
Denise,
ResponderExcluirimpossível não se arrebatar pelas letras da baianinha, não?
Como estava explicando ao MR, talvez eu seja das pessoas menos qualificadas para fazer esse tipo de seleção, mas sei reconhecer boa literatura e sei do que gosto.
Ah, o Rio é lindo até com chuva...
Malu, maluquinha adorável,
ResponderExcluirbom demais te ver aqui.
Pra quem não entendeu a sacanagem, ela quis dizer que eu só não sou grosso; o resto tá valendo... rsss
Querida, eu sei que você é do ramo e está devendo alguns textos seus, desde a época em que mantinha aquele blog super bem-humorado.
OP abriga poetas ao longo dos séculos, né? Outro que morou por lá foi o Vinícius...
Grosso?????????????
ResponderExcluirNunquinha da silva!!!
RM querido, cavalheiro, inteligente, docinho da blogosfera!!! rs
Se alguém disse ou pensou isso a seu respeito me diga quem foi que saio em sua defesa!!!
Vc foi (é) uma das mais interessantes pessoas que conheci por aqui!
Só estou encafifada com essa história de conhecer muito mais gente fora do mundo virtual do que eu pensava... INVEJA PURA!!!!!! rs
Eliana Mara escrevendo me faz viajar em suas crônicas, visualizar a história e esperar o que virá depois...
Pouco comento no blog dela pois´não dá nem pra "palpitar"... mas estou sempre de olho, lendo, admirando, aprendendo.
beijos
Mara
Ué Maroca!
ResponderExcluirAchei que você tinha brigado comigo, a exemplo da Patty (rsss). Fiquei pensando: putz, será que fiz alguma cagada no blog da Maroca também?
Quero lhe dizer, antes de qualquer coisa, que sua presença e seus posts, altíssimos astrais, fazem falta... Você é (foi) uma das mais interessantes pessoas que conheci por aqui!
Bem, só conheci pessoalmente a Luciana G e a Malu, que moram em BH, e a baianinha, que esteve aqui por ocasião de um congresso. O MR já conhecia ha uma pá de tempo e além disso, ele é macho, não conta, né?
Eu também tenho dificuldade de comentar os textos da Elianinha, mas ela não acredira nisto... rsss
Grande beijo, querida.
RM, Hoje?
ResponderExcluirDá pra fazer? rsrsrs
Claro, dona G(atona),
ResponderExcluirescolha (e me informe) local e horário.
Eu tô sem carro; se você quiser conhecer os famosos bares do bairro Prado, facilita pra mim. Do contrário, taxi serve pra que, né?
(ô MR, pena você não estar aqui em BH, heim? rsssss)
Oi, RM e Lu G:
ResponderExcluirVocês dois são traidores. Deixam pra avisar em cima da hora. Eu moro a 580 km. de distância. -- mais ou menos 9 horas de viagem de busão... rs rs rs
Fica pra próxima. No mês que vem, ou no máximo em dezembro, pintarei pelas bandas da Serra do Curral. Aí o chope será por minha conta.
Vocês dois e o resto da confraria que quiserem aparecer serão meus convidados...
Abraços aos dois e um beijão especial pra dona Lu G, a sumida que faz falta em nossos cantinhos virtuais...
MR
21/10 - 14:19
Quero ir também...
ResponderExcluirMe leva, RM??? no seu táxi???
Beijos
Combinado, poetinha baiana,
ResponderExcluirna volta pegamos o MR, que em troca de uma cervejada, não se incomodará nada com os apenas 590 quilômetros de distância, no banco de trás do táxi...
(rssssssssssss)
Pois vamos num bar que participa do Comida de Buteco, gente!
ResponderExcluirMe lembrei da Beth: é o Pato Roco rsrsrsrs
Quem passar por essas terras, anfitrionamos, com o maior prazer!
Quero ir tambémmmmmmmmmmmmm!!!!!!!
ResponderExcluirBeijossssssssssss
Cabe eu no táxi também???? rsrs
+ beijossssssssss
sugestões?
ResponderExcluirhttp://mcmacaia.blogspot.com/
Bom voltar aqui.
Maroca,
ResponderExcluircê chegou atrasada, menina. O táxi já tinha passado. Também quem manda você gastar duas horas escolhendo a roupa...
Ubbalda,
agradeço a sugestão, vou lá checar, assim que puder.
Mas não me lembro de tê-la visto aqui antes. De todo modo, seja muito bem vinda!