terça-feira, 2 de dezembro de 2008

PRIVILÉGIO OU RACIONALIDADE?

Luciana G já se pronunciou radicalmente contra o sistema de cotas por motivações raciais. Não sei o que pensam os demais membros da "Confraria" nem o distinto público leitor que me honra. Não compartilho radicalidades nesta matéria.

Explico: humanista por formação e democrata por osmose, sou incapaz de conceber política que não seja universal, que não trate a todos igualmente. Herança dos setecentos, na França, na América e em Minas, se assim o desejarem... Mas tenho idade e experiência o bastante para reconhecer que tal premissa nem sempre é o suficiente para garantir direitos verdadeiramente iguais, iguais oportunidades e justa distribuição dos benefícios.

Não sou especialista, mas também não posso considerar-me noviço nesse tema. É possível alinhar muito bons argumentos de ambos os lados, dos que defendem entusiasticamente o sistema e dos que o rejeitam subliminarmente. Não vou perder (o meu e o vosso) tempo elencando-os. Prefiro avançar um passo em direção mais propositiva, tentando delimitar aspectos que considero relevantes para que o debate saia da superfície e de posturas previamente cristalizadas.

Antes, porém, um argumento que me motiva ao debate: num país em que as melhores universidades estão destinadas aos filhos dos ricos e pagas com o dinheiro dos pobres; não é razoável a omissão em relação ao tema das cotas.

Os aspectos que considero importantes, para avançar o debate:

1. Faz sentido "importar" o modelo de cotas americano, sabendo-se que há enormes diferenças históricas na forma em que se deu a integração das populações negras nas respectivas sociedades, americana e brasileira?

2. Alguém conhece alguma alternativa para o conceito de "discriminação positiva", que não seja a inação das teses universalistas (e, em certo ponto, conservadoras) para tratar o problema, real, da desigualdade?

3. Há riscos importantes na adoção do modelo de cotas, além dos aspectos puramente ideológicos: criação de castas de privilegiados; dificuldades, práticas, para se definir quem tem direito a quê; surgimento de novas demandas por grupos que se sintam prejudicados ou desatendidos; tendência à reprodução do modelo, eternizando o que deveria, por lógica, restringir-se ao tempo necessário para surtir os efeitos desejados. Há formas de minimizar esses problemas, caso venha a ser consagrado o sistema de cotas?


ATUALIZAÇÃO (03/12/08 às 10:10 hs.)

Amigos, o debate parece ter migrado para as montanhas da Luciana G... Ops, digo, para o Verbo Venenoso que a moça mantém nas montanhas de Minas. Lá, essa garota ixperta (by MR) fez um comentário muito bem-humorado sobre o post anterior e a Elianinha abordou, de passagem, o tema do post corrente. Acompanhem aqui.

8 comentários:

  1. Bem, vamos por partes, digo, por cotas...rsrs

    1 - também não sou radical nesta, nem em nenhuma matéria, diga-se de passagem!

    2- sou especialista em nada, bom que fique bem claro também.

    3 - na época dos meus pais, os excelentes colégios eram os públicos. A educação pública degringolou, vieram as escolas mantidas pela Igreja. Mais tarde educação virou um negócio como outro qualquer, ou seja, degringolou tudo de vez, basta ver a qualidade das faculdades particulares - claro que toda regra tem exceções.

    4 - a educação básica da escola pública está sucateada. os prédios caem aos pedaços, sem quadras ou bibliotecas. A violência está intramuros, crianças armadas, professores levando surra, o tráfico dominando a paisagem. A filosofia saiu do currículo, já que não serve mais pra nada. A educação física não é mais obrigatória, os pobres se exercitam correndo da polícia, os ricos perdem calorias na academia. Os professores ganham uma merda. etc.etc.etc.etc.etc.

    5 - Os que podem, defendem-se como podem: filhos em aulas particulares de inglês e escolinha de esportes, matrículas caras em colégios bem equipados, com grandes cercas e controle rigoroso nas portarias. Crianças e jovens que podem se alimentar e podem também consumir um mínimo de cultura chegam, é claro, muito melhor preparados para o vestibular.

    6 - reservar vagas na universiade para quem estuda o ensino médio na escola pública resolve? Não, a classe média vai migrar os filhos pra escola pública e oferecer educação de verdade por fora, em cursos e cursinhos. E alimentos para o corpo e para a alma.

    7 - reservar vagas para negros e índios na universidade resolve? Não, pois a maioria deles não terá tido formação de qualidade no ensino fundamental, não terá tido acesso à cultura, a uma vida sem violência, enfim.

    8 - cotas, pra mim, é uma maneira de mascarar o verdadeiro problema, que é garantir qualidade à educação básica. Que é garantir igualdade de oportunidades para todos, não apenas no que diz respeito à escola, mas com relação a toda a qualidade de vida.

    9 - qualquer sistema de aprovação que não se baseie na competência ou na capacidade de aprender, com chances iguais para todos, pra mim não vale.

    10 - por fim, digo que também não acredito nessa loteria chamada vestibular, felizmente algumas universidades começam a alterar as formas de ingresso.

    Chega, que venha a patrulha! rs

    ResponderExcluir
  2. Ei moça,
    você alargou ainda mais o escopo: agora vai ter patrulha também de índio, classe média-baixa... rsss).

    Quer que responda aqui ou no RM NO VERBO?

    ResponderExcluir
  3. Deixa aqui mesmo, moço. O diálogo vai se espalhar, e as pessoas podem se perder...

    A gente faz assim, se você achar que vai chover pancada, melhor então mandar pro Verbo venenoso ou pro RM no verbo, as pessoas, já notei, tem certa preguiça de correr atrás rsrsrs

    ResponderExcluir
  4. Li num blog um posicionamento interessante. Você ora estará em vantagem, ora em desvantagem. Há confarias e confrarias. Utopia a gente acreditar que as pessoas não se discriminam; seja pela cor, pelo credo, pela instrução. Enfim...

    ResponderExcluir
  5. Respondendo apenas aos itens que sucitam controvérsia:

    3- Na época dos seus pais os negros (ou outras "minorias") tinham mais oportunidades? Duvido.

    6- Não creio que esse argumento seja verossímel. Acho improvável que as famílias de classe média pra cima, se dispusessem a esse movimento, a não ser obrigadas pelas mensalidades das escolas privadas.

    7- Mas este é exatamente o mesmo argumento de quem defende as cotas. Se não se reservar esta população ficará eternamente excluída.

    8 e 9- Digamos que você tenha razão. Quanto tempo demorará para que esse sistema (público, imagino) perfeito de educação básica comece a gerar os efeitos desejados? E enquanto isso, ficam as "minorias" chupando o dedo?

    ResponderExcluir
  6. Ei Rosinha,
    não ficou claro pra mim. Você é simpática ao sistema de cotas ou não?

    ResponderExcluir
  7. O sistema de cotas, pelo menos, é algo mais concreto do que os discursos do "Dia da Consciência Negra", o "Dia do Índio", o "Dia dos Sem eira Nem beira"...enfim. pff...

    ResponderExcluir