terça-feira, 23 de novembro de 2010

O MINISTRO, O DEDO E A EDUCAÇÃO



Amigos (que cada vez comentam menos nesse espacinho), separei duas notícias que muito me chamaram a atenção nos últimos dias; ambas relacionadas com o tema considerado o mais importante pela população brasileira: a Educação (aqui para o que penso sobre a matéria no atual governo).


A primeira ocorreu domingo passado no estádio do Morumbi, em Sampa. Não; não se tratou de nenhum evento esportivo com a presença do presidente da República, mas do concorrido show do velho e genial beatle Paul McCartney. Nas palavras do colunista de O Globo, Ancelmo Góis:


"O ministro da Educação, Fernando Haddad, estava na área vip do show de Paul McCartney, ontem, no Morumbi, quando uns jovens começaram a gritar: — Cadê o Enem?!?! Haddad, acredite, fez aquele gesto obsceno com o dedo médio. Depois, tentou consertar fazendo o sinal de paz e amor (daqui)." 


"Peraí". Será que li errado? Um ministro da Educação, em público, manda jovens (presumíveis) estudantes tomarem naquele lugar e nada acontece? Não foi demitido, sequer admoestado; os jornais não escreveram editoriais indignados; o Boris Casoy não falou "isto é uma vergonha"? Lembram-se do famoso caso do "aspone" presidencial Marco Aurélio "Top Top" Garcia? Bem, ali o gestual ocorreu na privacidade do gabinete, embora a câmera o tenha tornado público... Mas agora; aos olhos de mais de 60 mil pessoas e do mundo (já que trata-se de astro internacional)? 


Se há algo muito errado no país? Há! E que mais explícito simbolismo: aquele a quem entregou-se a formação (em todos os sentidos) das novas gerações de brasileiros; cujo salário é por nós pago, ofende nossos filhos e atenta contra o decoro do cargo. Que belo exemplo!


A outra "notícia" aconteceu há cerca de 2 semanas, num programa de tv a cabo chamado Globo News Painel. Semanalmente o jornalista William Waack recebe convidados para debater um tema específico da atualidade. No programa em questão, intitulado "Especialistas avaliam a educação no Brasil", debateram o engenheiro Renato Corona Fernandes, gerente do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp; o educador Mozart Neves Ramos, conselheiro do movimento "Todos pela Educação" e ex-reitor da UFPE; e Gustavo Ioschpe, economista especializado em educação e colunista da revista Veja (os vídeos completos, com duração total de aproximadamente uma hora podem ser vistos aqui aqui).


A seguir algumas frases selecionadas:


"Estamos num patamar de gastos com educação [5% do PIB] próximo ao de países desenvolvidos mas nossa educação nada tem a ver com a dos países desenvolvidos..." (William Waack)


"Tem que acabar com essa história de indicação política, em pleno século XXI, de diretores de escola. É preciso ampliar os recursos mas, sobretudo, melhorar a qualidade da gestão pública na educação"  (Mozart Neves)


"O gasto per capita por aluno/ano é hoje, na educação básica, de R$ 2.900. No ensino superior isto deve estar na casa dos R$ 15.500. Ou seja, quase seis vezes mais..."   (Mozart Neves)


"As conclusões [do estudo comparativo sobre indicadores de educação de vários países] são terríveis, quer dizer; não dá para um país que pretende ocupar um lugar importante no cenário internacional ter um hiato, com relação à educação, tão significativo quanto a gente tem para os nossos concorrentes..." (Renato Corona Fernandes)  


"Nós estamos nos últimos lugares do PISA [Programa de Avaliação Internacional de Estudantes], estamos mal de escolaridade...  (Renato Corona Fernandes)


"Antes de aumentar [recursos para a educação] nós temos que procurar gastar com eficiência. Nós não podemos ter um volume de desperdício, que nós medimos no trabalho, de R$ 56 bilhões. Ou 1,8% do PIB." (Renato Corona Fernandes)


"Em educação, o que as pesquisas mostram é que, a partir de certo patamar de gastos, você não obtém mais ganhos educacionais. E o Brasil já está nesse patamar, há bastante tempo." (Gustavo Ioschpe)


"75 a 80% dos pais estão satisfeitos com a escola [pública] porque só enxergam a perfumaria: transporte, merenda, que a escola tá bonita, que tem vaga... Esse quadro de satisfação é que permite esses problemas como ineficiência e corrupção... Você investe, investe, investe; não dá resultado e ninguém se preocupa..." (Gustavo Ioschpe)


"Os números são muito ruins. A maioria dos estados não está conseguindo alcançar as metas, à medida em que estas deixam de ser muito fáceis..." (Mozart Neves)


"No caso do ensino médio a distância do Brasil para outros países está aumentando. Há, portanto, perigo de retrocesso na posição brasileira." (Mozart Neves)


"Quando se tem a percepção [falsa] na sociedade de que é boa a qualidade da escola e que as grandes vítimas são os professores, geram-se demandas não para melhorar a qualidade da educação mas para melhorar a situação dos professores."  (Gustavo Ioschpe)


"As pesquisas mostram que não há relação entre salários de professor e qualidade de ensino." (Gustavo Ioschpe)


Agora entendo melhor porque nem o mais abjeto comportamento de um representante do Estado brasileiro, a quem foi delegada a nobre tarefa de cuidar do futuro da nação, espanta mais as pessoas... Noutras palavras - e para ser bem didático - o ministro apenas explicitou o que já vinha fazendo há tempos com a educação pública no Brasil!


Ministro, com todo o respeito que a "otóridade" merece:







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15 comentários:

  1. Minha mãe foi professora de primário, meu marido é de curso superior. Não via e não vejo o salário fazer com que trabalhassem pior ou melhor. Talvez mais feliz ou infeliz…
    O sindicalismo pôs a perder o pouco que restava de honra e dedicação dos professores, pq a competência vem sendo perdida paulatinamente nas faculdades de pedagogia invadidas pelo esquerdismo. (neste portal http://chaves.com.br/ vc encontra material de alta qualidade sobre isso).
    Só posso dar graças a Deus que minhas meninas já passaram dessa fase, mas certamente a baixíssima qualidade da educação que obtiveram em escolas públicas contribuiu para que não entrassem em universidades do governo.
    Não ensinavam a estudar, a fazer pesquisa, não corrigiam as lições… (chegaram ao ponto de corrigir um erro, errando também!!!)
    O outro lado do problema é que os pais abriram mão de vez de educar seus filhos, de acompanhar a educação e de incentivar o estudo em casa. Comprar bons livros, assinar ou trazer para casa revistas e jornais, assistir jornal pela TV, ajudam em 50% o progresso dos filhos…

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  2. Esse cara tem teses bem estranhas. Li pedaços aqui e ali, nem sei se são exatamente verdadeiros. Não vou comprar seus livros pra verificar que eu tenho mais o que fazer.
    Mudando de pato pra ganso, Rm, você ainda dá aulas?

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  3. Fui professora do Estado do Rio durante vinte anos. Concordo com o que diz Mozart Neves
    "Tem que acabar com essa história de indicação política, em pleno século XXI, de diretores de escola. É preciso ampliar os recursos mas, sobretudo, melhorar a qualidade da gestão pública na educação"
    Não adianta umentar a verba se não fiscalizarem os gastos indevidos por alguns diretores. Não há dinheiro que baste, se for desviado ou mal empregado.
    Também concordo com o comentário acima, da Myrian Dauer: Não via e não vejo o salário fazer com que trabalhassem pior ou melhor. Talvez mais feliz ou infeliz…
    Hoje trabalho numa escola particular e realizo o mesmo trabalho, com a mesma seriedade e eficiência de quando trabalhava no Estado.
    Parabéns pelo artigo!

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  4. Myrian,
    bem vinda! Agradeço muito o ótimo comentário e sugiro que você assista aos vídeos, se puder. Acho que boa parte de suas observações encontram respaldo em outros aspectos que não enumerei aqui.

    Japa,
    a tese de doutorado do ministro do dedão é algo como "A Fenomenologia de Marx na Educação de Garanhuns versus a Filosofia Hegeliana de Tiririca"... rss
    Tenho uma relação de ioiô com a academia. Atualmente tô "fondo"...

    Cláudia,
    bem vinda. Agradeço muito o simpático comentário, com o qual concordo integralmente: da forma como foi gerida nos últimos anos, a educação passou a ser mera questão corporativa. É preciso resgatá-la para a sociedade!

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  5. Sou professorA, fiz Pedagogia...NÃO EXERÇO... Ser professor,médico,policial...ou seja td que e do governo enoja!
    Porque, que exemplos temos visto por parte de nossos governantes que fosse bom para nossos filhos? Se para nós não serve,imagine para nossos filhos!
    Eu estou escandalizada com tudo , mais tudo, tudo, que vem do governo.Acho que o "Pt" trouxe imoralidade em todos os níveis.Enfin governo omisso ,povo omisso, empregados omissos, empresas omissas...etc!Todo mundo faz o que quer!
    ONDE ESTÁ O GOVERNO? NINGUEM SABE. SABEMOS SIM, QUE ESTÁ NO MEIOS DOS ESCÃNDALOS!
    Deveríamos pedir pedido de desculpas a este ...ANIMAL DO DEDO DO MEIO!!

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  6. Texto perfeito.
    A situação da rede de ensino pública no Brasil é diretamente proporcional à beleza do nosso futuro chefe de Estado.
    Outra coisa que não dá mais para engolir é o fato deste Governo de quinta categoria tentar remediar a doença ao invés de combater o foco transmissor. Como ? Implementando as estúpidas cotas raciais.
    Segue o link explicitando minha opinião sobre o assunto: http://hungrygenious.blogspot.com/2010/11/sistema-de-cotas-um-cancer.html

    Abraços.

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  7. Meus primeiros anos de estudo foram em escola pública, numa época em que professores e ensino eram mais valorizados e respeitados.
    Infelizmente o q vemos hoje é esse triste quadro mt bem descrito por vc em seu artigo. O ato do ministro da Educação é um escândalo! E pior é não haver um estado de indignação e revolta por parte da sociedade como um todo. O pior é não haver qualquer tipo de punição para esse inconsequente. Ele não se envergonha e nem se constrange. Se tivesse um mínimo de vergonha já deveria ter pedido demissão e nos poupado de mais esse indecoro. Até quando nosso dinheiro vai ser usado p/pagar a gestores incompetentes cujo interesse maior parece ser o de deseducar.
    Parabéns pelo texto!

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  8. "Relaçào de ioiô com a academia"... cara besta!

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  9. "Nação eleita",
    bem vinda! Agradeço o simpático comentário e acho que é preciso recuperarmos bandeiras que foram apropriadas por outros...

    Roberto Siciliano,
    bem vindo! Também faço restrições às cotas, mas é necessário que se ofereçam alternativas. Aqui nesse bloguinho há um longo debate sobre essa matéria. Consulte, se desejar, a tag "a questão das cotas".

    Tânia (conheço mais de uma!),
    agradeço o simpático comentário. Ele e o chefe dele não tem vergonha, mas o que falar dos jornais e da sociedade, enfim, que não mais se escandalizam?

    Anônimo,
    tô pensando aqui o que leva uma pessoa, de forma anônima, a perder tempo fazendo um comentário besta desse... Mas fique à vontade (mantida a educação, claro!).

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  10. rm

    Esse assunto é muito complicado para discutir aqui, mas gostaria de dizer que os salários vergonhosos pagos aos professores da escola fundamental é uma das razões SIM pela péssima qualidade da educação. A maioria desses professores precisam trabalhar EM SALA DE AULA em docência em 3 turnos para poder sustentar a família. Ora, como qualquer outra profissão, o professor precisa estudar, preparar aula, corrigir trabalho e el@ faz isso quando se está no efetivo exercício do trabalho de manhã, de tarde e de noite?

    Isto é apenas uma palha dos problemas que enfrentamos no sistema educacional deste país!

    bjos
    Anne

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  11. Ei Anne,
    sim, mas é bom ao menos pra apimentar a conversa. E o fato de ser verdadeira sua afirmação não torna menos verdadeira aquela que aponta o corporativismo e o sindicalismo político como uma das mazelas desse mesmo sistema...

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  12. Como em todas as profissões!

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  13. Mas se tal comportamento afeta o bem comum, acho que a sociedade deve se proteger das corporações!

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  14. rm
    sim, com certeza. Mas a sociedade só poderá se proteger da corporaçao educacional reconhecendo o que realmente está acontecendo nas escolas e passar/voltar a respeitar a figura do profess@or e apoiá-lo e não permitir o que anda acontecendo.

    Eu sei o que acontece neste setor muito bem e quando se fala em investimentos na educação é sempre em torno de quantidade mas não na melhoria da qualidade seja pedagógica e/ou administrativa, logística e ética.

    bjinhos
    Anne

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  15. Anne,
    claro que respeito sua opinião e também tenho (modesta) experiência nessa área.

    Mas o que está acontecendo é uma inversão de valores: a educação não anda mal por conta dos salários e condições de trabalho dos professores e são expressivos os recursos destinados ao setor.

    Tem mutreta aí e os professores, posando de vítimas, contribuem pra mutretagem...

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