sexta-feira, 10 de outubro de 2008

NUNCA TE VI. SEMPRE TE AMEI.

.
Lamento desapontar quem pensa que o título acima tem a ver com a era da internet. O tema está em pauta desde, pelo menos, as famosas cartas de Platão. Mas é verdade que as relações humanas, mesmo as amorosas, parecem trilhar inexorável caminho de crescente virtualidade, a partir do desenvolvimento da rede mundial de computadores.

Há quem ocupe boa parte de seu tempo livre, especialmente as novas gerações, "teclando" "teclando" com pessoas, conhecidas ou desconhecidas, até mesmo com o propósito explícito de um eventual relacionamento afetivo, amoroso ou sexual. Tempo este dispensado, inclusive, em detrimento de outras atividades sociais que poderiam resultar na consecução de idênticos objetivos.

Salas de bate-papo, orkuts, MSN e outras ferramentas de mensagens instantâneas, sites de relacionamento e namoro e mesmo os blogs substituem, em parte, o que em passado bem recente se fazia nas festas, nos bares, nas casas de amigos, nos clubes e em outras atividades sociais não-virtuais. Recomendo a quem queira ter uma visão muito bem-humorada e escrita sobre esse pedaço da web, visita ao blog de minha amiga Senhorita Rosa, com o candelabro na biblioteca.

Mas o que me moveu a escrever esse postinho foi um texto de outra amiga, Maria Elisabeth, baiana e bióloga, bilíngue e bacana, cigana and bee. E com um especial pendor para as letras. Beth usou a expressão "serra que chora" em alusão à Serra da Mantiqueira, que divide os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. E à lenda tupi que lhe originou o nome.
.
Não saberia dizer exatamente porque, mas me veio à memória outra música marcante em minha vida: "Serra da Boa Esperança", de Lamartine Babo, mais famoso pelas marchinhas de carnaval, mas dono de obra variada e belíssima. Esta música, além de linda, tem uma curiosa história e aqui, depois dessa longa introdução, começo, de fato, o post.



Auge da era do rádio, numa pequena cidade do sul de Minas, um jovem coleciona fotos autografadas pelos famosos cantores. Para obtê-las de homens, usa o artifício de pedí-las, em cartas, sob pseudônimo feminino. Assim começa a história de amor entre Lamartine Babo e Nair, esta última inspirada no nome real da sobrinha do jovem colecionador de fotos.

No entanto o famoso compositor nunca mandava a esperada foto e insistia, demonstrando carência e afeto, para que Nair continuasse a escrever-lhe. O affair ameaçou tomar proporções preocupantes quando o jovem convidou Lamartine para uma visita à cidade de Boa Esperança, ocasião em que esperava esclarecer a confusão.

Ao contrário do que se pode supor, a revelação não melindrou o compositor, que tornou-se amigo do missivista, visitou a cidade outras vezes e presenteou-a com esta linda canção, cuja letra foi escrita pelo jovem colecionador de fotos.

Serra da Boa Esperança (Lamartine Babo/ Carlos Neto)

Fransico Alves - Serra da boa esperança


Serra da Boa Esperança, esperança que encerra/No coração do Brasil um punhado de terra/No coração de quem vai, no coração de quem vem/Serra da Boa Esperança meu último bem/Parto levando saudades, saudades deixando/Murchas caídas na serra lá perto de Deus/Oh minha serra eis a hora do adeus vou me embora/Deixo a luz do olhar no teu luar Adeus/Levo na minha cantiga a imagem da serra/Sei que Jesus não castiga o poeta que erra/Nós os poetas erramos, porque rimamos também/Os nossos olhos nos olhos de alguém que não vem/Serra da Boa Esperança não tenhas receio/Hei de guardar tua imagem com a graça de Deus/Oh minha serra eis a hora do adeus vou me embora/Deixo a luz do olhar no teu luar Adeus.


ATUALIZAÇÃO (11/10/08 às 10:45 hs.)

Como alguns ilustres leitores demonstraram interesse em conhecer um pouco mais da obra e vida do talentoso compositor, indico esse link, que contém completa e muito boa biografia.

Sobre sua vasta obra, acrescento que além das eternas marchinhas, compôs os hinos dos clubes de futebol cariocas (incluindo o Vasco da Srta. Rosa) e uma bela Ave-Maria que até hoje se toca nas primeiras comunhões e coroações. Além dessa que postei, é autor de pelo menos mais 2 clássicos da mpb: "Eu sonhei que tu estavas tão linda" e Rancho Fundo".

23 comentários:

  1. RM:

    É um post ou são dois posts, homem?

    Pois bem: Penso que os blogs, os chats, os orkuts, os flickrs, os MSN e outras ferramentas proporcionadas pela internet são úteis e podem ser utilizadas para diversas finalidades. No aspecto dos relacionamentos afectivos, não é - afinal - muito diferente do que acontece nos bares e nas festas ou noutros points de encontro: Aqui como ali existe muito de superficialidade e pouco de profundidade; aqui como ali relacionamentos (de amizade, de amor, etc) podem surgir de igual forma: conhecendo-se, conversando, trocando ideias.... Julgo haver ínumeros exemplos de pessoas que se conheceram na internet e se apaixonaram, namoraram e casaram, da mesma forma que outros se conheceram em bares, no ônibus, no trabalho, nua festinha do bairro... e casaram.

    O que ninguém deve esperar é que tudo aqui seja só sucesso e pessoas sensacionais, porque nos outros lugares não é e não são também.

    A vantagem crucial me parece ser a possibilidade que a gente tem de conhecer pessoas que de outra forma só hipoteticamente conheceria; e, também, sobretudo nas cidades pequenas, enquanto ali você encontra sempre as mesmas pessoas no bar, a tomar a mesma cerveja, a ver o mesmo futebol e a falar as mesmas coisas de sempre, aqui você encontra pessoas novas, com ideias e assuntos novos.

    Por isso, eu gosto, e acho até que é uma forma engraçada de viajar sem sair de casa.

    Quanto ao post da Senhorita Rosa, li-o superficialmente... E, bem, tem gente que não está bem em lugar nenhum e que acha que só ela presta porque todos os outros são malucos... Deve ser frustrante, entendo-a!

    E pronto: agora vou dar uma voltinha à serra da Mantiqueira, outra à serra da boa esperança, escutar o Francisco Alves, coisas que ninguém conhece nem sabe falar aqui nos bares das redondezas...

    Abraço.

    ResponderExcluir
  2. PS. - Porém, acho certa a ideia de que, por vezes, os meios da internet ao mesmo tempo que nos aproximam de pessoas que estão distantes, nos afastam de outras, que nos estão próximas.

    ResponderExcluir
  3. Eu acho que são dois posts, tbm. rsrs
    Aliás três, contando com o de Mr Almost aqui. rsrsrs

    Nesse assunto fico no meio termo, preciso dos dois em minha vida. Birtual e Presencial.
    beijoss

    ResponderExcluir
  4. Grande Mr Portuga,
    é apenas um post. Esperei ilustrar com o caso de Lamartine, este que parece um rumo cada vez mais corriqueiro de pessoas (julgar) se conhecerem.

    Suas observações, como de costume, revelam que você, de pirado, só tem o talento e verve para brincadeiras.

    Gostaria de ouvir outras pessoas, que também tem muito café no bule, mas nem sempre se dispõem a conversar aqui...

    ResponderExcluir
  5. Celine, gata baianinha,
    claro que não são excludentes, mas você não acha que as pessoas estão falando muito e fazendo pouco (mais ou menos como o presidente da República? rsss)?

    ResponderExcluir
  6. RM:

    Em relação a um dos temas do post, não posso comentar porque não li as indicações que você faz.

    Sobre a canção "Serra da Boa Esperança", duas observações: que eu saiba, trata-se de letra e música do Lamartine Babo. Desconheço a participação desse tal Carlos Neto que seria o tal dentista que trocava cartas apaixonadas com o compositor, usando o nome de uma irmã ou sobrinha. Acho que há um equívoco no crédito a esse cidadão que deveria ser bem chegado às prendas femininas... rs rs rs

    Abraços,

    MR
    10/10 - 16:31

    A melhor interpretação dessa música -- que se tornou uma espécie de hino da cidade de Boa Esperança que, por sinal, é vizinha de Campo Belo e tem um excelente festival para novos compositores e intérpretes há mais de 25 anos, criado, na época, por um amigo, o Gleizer Naves -- é a do Duardo Dusek

    ResponderExcluir
  7. RM

    O segundo post me deu uma saudades do meu pai, bom mineiro e que era fã de Chico Alves. E toda vez que nós passávamos pelo lugar do acidente na Dutra ele falava do cantor. Já era uma brincadeira entre os filhos adivinhar o que ele iria falar na hora. Belas lembranças.

    Sobre o primeiro post, fecho com o Mr Almost. Aqui, como lá, há coisas para conhecer, ignorar, odiar, amar. E, claro, saber dosar.

    Bjs

    Bjs

    ResponderExcluir
  8. Sacanagem, Decanão!
    Daqui a pouco você vai falar que os dois boiolavam na serra... rsss

    Quanto à autoria, fiz questão de visitar várias páginas de internet, mantidas por moradorres daquela cidade e a citação à contribuição de Carlos Neto é muito frequente. Considerando que era muito comum a "venda de sambas" naquela época, acho bem provável que seja verdadeira a história. Mas tentarei confirmar depois o copyright.

    Mas o que impressiona mesmo é que pouca gente conheça esse causo e, sobretudo, que nunca o transformaram num filme...

    A versão que gosto mais é instrumental e foi gravada por Vagner Tiso e César Camargo Mariano.

    ResponderExcluir
  9. Dona gatona dos olhos d'água,
    eu sei que não escrevo tão bem quanto a senhora, mas é só um post, tratado de forma, digamos, intertextual... rsss

    E acho que a história do Lamartine (vulgo Lalá, MR... rsss) se encaixa perfeitamente nesses "novos" (mais velhos que a serra) jogos de sedução da web.

    Por exemplo, até hoje não sei se o(a) seu leitor(a) Aiaiai é homem ou mulher. (rsss)

    ResponderExcluir
  10. Eu não digo que é muito engraçada a postura do Mr. Almost? Concordo que ele escreve bem; mas juro que não sei de onde ele tira 'eu me achar'.
    .
    E maluco é sempre, sob qualquer ótica, seja dos malucos ou dos sãos, uma questão de ponto de vista e de livre arbítrio; pero não de superioridade; como ele supõe.
    .
    E eu, caríssimo RM, só tenho a lhe parabenizar pelo post e vir dizer um adeuzinho, hasta pronto. Tô dando um tempo do blog e de gentes que não entendem metáforas e levam sempre as coisas pro lado pessoal; ainda que eu aproveite os motes e desenvolva de uma forma, mmm, digamos, mais genérica.
    .
    Talvez um dia apareça por aqui uma Alice, ou quem sabe uma Josefina. Srta. Rosa vem dizer que não voltará porque cansou desta vida.
    .
    Essa é a vantagem do mundo virtual. Somos como gatos; não? E acho eu, acho eu, que en la próxima vida no haberemus españoladas.
    .
    Bom final de semana, caríssimo! (e pena a música estar bloqueada aqui no trabalho - que después das 17h de uma sexta-feira passa a ser figurativo.)

    Bezzos,

    ResponderExcluir
  11. Srta Rosa,
    a mim me desagrada muito esta notícia. Acho que você escreve (e muito bem) um blog muito divertido, a partir da personagem criada.

    Só espero não ter contribuído para sua decisão com esse postinho, que pretendia mais homenagear você e Beth, duas blogueiras que gosto muito de ler.

    Quanto à desavença com o Mr Almost já tive oportunidade de sair na porrada com o meu amigo Portuga, mais de uma vez (e espero não ter que fazê-lo aqui, de novo), mas como admiro e me considero amigo de ambos, prefiro me omitir.

    Se não tiver outro jeito (e lamentarei muito): hasta la vista, baby!!!

    ResponderExcluir
  12. Tenho nada pra falar sobre o(s) post(s) de hoje não.

    O espaço dos comments está mais divertido... rsrsrs

    Bom fim de semana a todos!

    ResponderExcluir
  13. Madame Filó,
    sua presença aqui, comentando ou não, honra esse bloguinho de venenos.

    (bem, na verdade esperava um pouquinho mais de abertura, um arranhãozinho de unhas nas costas, quem sabe um sussurro ou mesmo um gemidinho... rssss)

    ResponderExcluir
  14. Grande RM::

    Venenosa, mesmo, a sua língua, PQP!
    Veja o que achei no site Museu da Canção -- o link está aqui
    http://museudacancao.multiply.com/photos/album/38:

    "O dentista Carlos Alves Neto, irmão (existem referências que o colocam como tio) de Nair, assumiu: era ele quem mandava as cartas. Lalá sorriu amarelo, como quem mastigou pimenta achando que era pitanga, mas ficou na cidade e conheceu melhor Carlos Neto. Tornaram-se grandes amigos e há quem acredite que algo mais ali se passava ao ler as cartas que trocaram depois do ocorrido(“Sei que Jesus não castiga um poeta que erra”). A música começou a ser composta em Boa Esperança e veio a fazer grande sucesso nas vozes de Chico da Viola (Francisco Alves) e Silvio Caldas".
    Pronto, boiolaram o Lalá mais de 40 anos depois de morto. Sacanagem. Esta gente não presta. Devem ser os escorpiões que andam soltos por aí...
    Aproveitando o ensejo e o tema musical, vi no Bom Dia Brasil que hoje é a data do centenário de nascimento do Cartola, o grande poeta e compositor.
    Fora "As Rosas Não Falam", que é "hors-concours", quais outras músicas dele você postaria como Clip do Dia se fosse escolher?

    Abração,

    MR
    10/10 - 22:36

    ResponderExcluir
  15. RM.
    Nunca te vi mas hei de guardar a tua imagem. Sempre bem te vi nos olhos de alguém que não vem. Deixo a Cantiga e a imagem da Serra na luz do teu olhar inseto peçonhento e gentil. Deixo aos poetas que erram o veneno da rima de tudo isso aqui com as murchas caídas na Internet de Zeus. Parto levando comentários que castigam a hora do adeus. Depois de quase ter dobrado o cabo da boa esperança vou em boa hora para o meu recanto marítimo. I have coffee for you! And I have silence too.

    A versão que gosto mais é a de Cida Moreira e Célia.

    ResponderExcluir
  16. Vem não, heim decanão! (rsss)

    Não há no postinho uma única menção a esta possibilidade que, convenhamos... rsss
    O que sei é que Lamartine, além de compositor dos mais profícuos era também um tremendo gozador e feio pra caraca, só vindo a se casar quase aos 50 anos...
    (vou fazer uma atualização da postagem, indicando alguns links sobre o autor)

    Quanto ao Cartola, citaria, assim de memória, "O sol nascerá" (que fez parte do famoso show Opinião, da Nara Leão), "O mundo é um moinho" (predileta de ninguém menos que Carlos Drummond de Andrade), "Acontece" e "Cordas de Aço".

    ResponderExcluir
  17. Beth,
    se você gostou, valeu a pena ter escrito o postinho.
    Também nunca te vi, mas aprendo a admirá-la, a cada dia, mais e mais.
    Não recuso café, muito menos de uma bela baiana...

    ResponderExcluir
  18. RM.
    Vá lá assistir um trechinho de Metropolis, 1927 (Direção Fritz Lang).
    Um acarajé.

    ResponderExcluir
  19. RM, querido

    este título não me deixa pensar em outra coisa, que não seja o filme homônimo, que gostaria muito de rever junto com você, para trocar idéias depois.
    Beijos e todo meu carinho.

    ResponderExcluir
  20. Beth, linda

    isso tão lindo que você escreveu para RM merece registro:

    "I have silence too."


    Muito lindo mesmo... como você!Adoro saber que você e RM estão amigos e que moram juntinhos no meu coração.


    Beijos

    ResponderExcluir
  21. Sobre o post de RM , e o sobrepost de MR Almost, tenho a alegria de dizer
    que através do site conheci os dois virtualmente e depois,
    nos demos o presente de nos conhecer pessoalmente.
    Por isso, ter abraçado esses dois moços lindos, gentis, piores homens do mundo, meio cafajestes e meio cavalheiros, foi muito bom mesmo.

    ResponderExcluir
  22. Hugamélia (rsss), bem vinda,
    agradeço o convite. Irei sim, com o maior prazer.

    Elianinha,
    no Savassi Cine-Clube ou aí em Salvador?
    Eu que tenho a bendizer por ter sido possível recebê-la aqui nas montanhas.
    (você se encontrou com aquele cafa do portuga? Não posso crer... rsss)

    ResponderExcluir