domingo, 10 de janeiro de 2010

A QUESTÃO DA LEI DA ANISTIA (1)


  Paulo Vannuchi, ministro da Secretaria de Direitos Humanos, que ameaça pedir demissão. Espero que Lula a aceite...


Não é dos mais fáceis o tema em pauta: tecnicamente complexo, politicamente explosivo e sujeito à paixões de lado a lado; o debate ganhou um componente dramático com a recente edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) III  e o subseqüente pedido conjunto de demissão do ministro da Defesa e dos comandantes militares das três armas (aqui para uma rápida análise que fiz no mesmo dia em que foi lançado o Programa e aqui para uma abordagem mais detalhada feita pelo meu amigo jornalista Marcos Rocha).

O cerne da discórdia está na eventual criação de uma "Comissão da Verdade", com poderes para investigar casos de possíveis crimes anistiados pela Lei de 1979 ou, em termos mais gerais, na definição dos limites da referida lei. A gravidade da crise não se limita, entretanto, ao âmbito do governo. O STF - Supremo Tribunal Federal está em vias de julgar a ação, encabeçada pela OAB - Ordem dos Advogados do Brasil (mas patrocinada pelo governo federal), que contesta a constitucionalidade da Lei da Anistia, em alguns de seus aspectos. Outrossim, vários componentes do Programa, em nada relacionados com o tema anterior, também ganharam destaque no noticiário e contribuem para o clima de crise institucional que se inaugurou desde o lançamento do Programa, com diversos segmentos se pronunciando contra a sua suposta abrangência.

Nesse primeiro artigo pretendo esclarecer minha posição contrária à revisão da Lei da Anistia. Nos dois seguintes espero analisar alguns dos argumentos pró e contra a proposição.

Apesar da complexidade do tema creio ser possível desdobrar a análise em 3 diferentes vertentes, de sorte a criar parâmetros para avaliar análises distintas. Do contrário até o debate fica prejudicado, na medida em que cada analista trata de variáveis desconexas e fortuitas. São as 3 vertentes, na minha opinião, a jurídica, a política e a ética.

Na vertente jurídica - das 3 a mais específica, mas nem por isso menos complexa - destaco 2 princípios, acima inclusive das especificidades das leis: o princípio da legalidade e o princípio da não-retroatividade. No tocante à primeira cumpre salientar que vivemos (há dois decênios, pelo menos) em pleno "estado democrático de direito". Ora, nesse quadro é absolutamente conhecido o endereço de quaisquer demandas jurídicas da sociedade: é na justiça que se processam e se dirimem diferenças quanto à interpretação das leis. Por que uma comissão para propor uma nova lei? E por que uma nova lei? Por que não basta ao governo federal patrocinar uma argüição de inconstitucionalidade da lei de anistia?

O segundo aspecto jurídico talvez responda as perguntas anteriores: dos mais comezinhos princípios jurídicos é o de que uma lei não pode retroagir em seu efeitos. Ou seja, mesmo que o STF se rendesse à tese da não-prescrição dos crimes de tortura (o que parece pouco provável), tal decisão não traria conseqüências práticas, na medida em que a lei (que tornou imprescritível o crime de tortura) não pode retroagir de 1995, quando foi promulgada.

Quanto à vertente política proponho que se avalie os aspectos positivos da lei de 1979 e os de uma eventual revisão a partir dos mecanismos propostos. Se quanto à primeira resta evidente o forte impacto positivo que teve na normalização institucional e na redemocratização brasileiras; que vantagens, politicamente, trariam uma revisão daquele processo? Melhoraria o quadro partidário? Contribuiria para mudar maus hábitos políticos? Teria efeitos sobre a legislação eleitoral?

Finalmente, a mais abstrata das abordagens: a vertente ética. Aqui tenderia a concordar com os que defendem algum tipo de punição àqueles que, como agentes públicos, perpetraram ações prejudiciais a cidadãos brasileiros, por motivação política. Mas concordo apenas por razões pedagógicas: para que no futuro ações similares sejam desestimuladas pelo arcabouço jurídico do país. Vale dizer, defendo algum tipo de restrição ou reprimenda a agente público que aceitou participar de ações ilegais com fins políticos; mas para que, no futuro, possam estes mesmos agentes públicos recusarem-se a ordens ilegais. Que punição ou reprimenda? Não faço idéia, mas creio que isto não deve decorrer de nova legislação e sim de uma interpretação do Judiciário, soberano para decidir sobre a interpretação das leis e da Constituição..
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14 comentários:

  1. Paradoxal decreto esse,o inverso desse teresloucado governo!pago para ver,pois para lulalélé sair de sanhaçu esse,vai ter que rebolqar,rebolar e rebolar,perceba carpissimo que ele as instituições ataca de flancos vários,percebo o verde oliva aviltado,o de pólvora cheiro assim como a derrocada da candidatura dessa terrorista psicopata!
    perdão se fuerte fui,mais decreto esse uma aberração às instituições éééééé´!
    respeitosamente te tributo e referendo!

    vciva a vida!
    Viva o Brasil sil sil!

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  2. Ricardo,
    também não acredito na eterna ignorância do presidente. Acho mesmo que ele está muito mais próximo dessas posições do que se costuma atribuir...

    Agradeço o comentário e a participação.

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  3. Bom dia rm
    Na realidade não entendo bem direito qual é o objetivo disso... E estou com preguiça de tentar entender!!! Tanta coisa que precisa de cumprimento de leis neste país - o país em que se é lei, vamos descumpri-la - ...

    Estou precisando de férias!!!

    Bjos :-)
    Anne

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  4. Ei Anne,
    bom dia. É difícil mesmo entender as pataquadas petistas.

    Férias? Você já mora num lugar paradisíaco, nega, e ainda quer férias? rss

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  5. Prezado RM:

    Depois das cenas de sexo explícito no post anterior (rs rs rs) sobre as quais prefiro fazer e praticar ao invés de falar (rs rs rs), vamos a um tema que me interessa profundamente.
    Você está dando mais importância ao tema da Anistia do que aos outros "bodes na sala" colocado no Decreto 7037. Sobre este tema, minhas posições são bem próximas das suas. E, mesmo tendo sido eu próprio uma das vítimas dos torturadores militares e policiais, inclusive da PM de Minas, nos Ano de Chumbo, aho que a Lei de 1979 pôs fim a um capítulo da vida política brasileira e não comporta nenhuma revisão nela. Sou contra também a chamada "revisão para os dois lados". Não acrescenta nada à democracia brasileira punir torturadores ou punir militantes que praticaram ações revolucionárias com o uso de violência e até o cometimento de crimes.
    Deveríamos, sim, fazer como fez a África do Sul em relação ao Apartheid: criar uma espécie de museu ou memória viva, com o máximo de depoimentos, filmes, vídeos, testemunhais, etc. --inclusive dos torturadores e dos que justificam os métodos violentos de repressão --, para que saibamos o que de fato aconteceu neste país e para que tais atos insanos nunca mais se repitam. Este deveria ser o fulcro do projeto do PNDH-3 na parte que se refere à Anistia.
    O que adianta pegar o coronel Carlos Alberto Brilhantes Ustra, um notório torturador da época, como bode expiatório, quando, na verdade, por trás dele davam as ordens para torturar e matar -- ou aprovavam plenamente tais atos -- os seus superiores hierárquicos, inclusive os ministros militares e os presidentes da República da época, como foi o caso do Médici e do Geisel?

    Não traria benefício nenhum. Agora, se ele, Brilhante Ustra, fosse cooptado a falar e a contar o que sabe, inclusive sobre as técnicas de tortura que aplicadas no Brasil eram "exportadas" para os demais países do Cone Sul (sobretudo Argentina, Chile e Uruguai), aí, sim, estaríamos dando uma contribuição relevante à democracia, não apenas brasileira, mas latino-americana e mundial.
    O tema é vasto e complexo, concordo. Teremos que voltar a ele muitas vezes ainda.
    E, para finalizar, obrigado pela citação e pelo link ao meu/nosso PG.

    Abração,

    MR
    11/1/10 - 11:56

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  6. Ótimo comentário, caboclo decano,
    gostei muito dos seus argumentos, sobretudo na sua insuspeita pessoa de ex-militante contra a ditadura.

    Pra mim essa história toda tem um único objetivo: o de pressionar a futura decisão do STF sobre o tema. São uns bandoleiros esses petistas...

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  7. Excelente postagem!
    Excelente abordagem!
    E obrigada, Rm, por ter destrinchado de forma tão didática e inteligente o teor da "asneiragem petista"...
    Os leigos, como eu, agradecem! rs
    E pra completar, o lúcido comentário do MR...
    Realmente essas duas cabeças batem um bolão!!
    Mentes pra lá de privilegiadas...

    Diante de tudo o que vcs falaram quem sou eu pra discordar!! rs

    Mas, mesmo assim, ainda me atrevo a deixar meu humilde pitaco!
    Sou totalmente contrária a remexer no passado nesta altura do campeonato! ( a não ser da forma brilhantemente defendida pelo MR... ) Acho que as atenções devem estar voltadas para as "violências" que vêm sendo feitas bem às nossas vistas, por toda essa classe política reinante e dominante... e nojenta!!
    No fundo tudo isso pode ser mais uma artimanha pra desviar a atenção do que deve ser averiguado e combatido veementente no PRESENTE, isto sim!
    Parabéns mais uma vez aos dois cérebros que aqui reinaram soberanamente... Show de bola!!
    Helô

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  8. Ei Helô,
    agradeço a gentileza do comentário e das referências e show de bola é ter o prazer da sua companhia...

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  9. Parceirim,
    mais uma vez parabenizo essa sua disposição em trazer discussões relevantes (não que a do post anterior também não seja ...risos!) com a sua abordagem realmente jornalística que possibilita a "mimzinha", pobre mortal sem paciência de aprofundar nos detalhes, um melhor entendimento.
    Lembro que, à época da promulgação da lei da anistia, o que mais se destacava era a volta de um monte de gente que teve que ir embora. Devo confessar que, eu mesma - que colhi muitas assinaturas e participei de tantas mobilizações pela "anistia ampla, geral e irrestrita" - nunca havia parado para prestar atenção ao texto integral dessa lei. À época, a grande festa era: "nossos" presos e exilados políticos seriam, finalmente, libertados.
    E ainda, temos que lembrar que a anistia foi fruto de uma batalha gloriosa de toda a população brasileira contra a ditadura. Na esteira dessa vitória veio a imensa mobilização pelas eleições diretas (alguém se lembra do Dante de Oliveira?) que pôs fim, definitivamente, à ditadura. E agora? Querem "rever" o quê? Estão dizendo que fizemos errado? Que não era bem aquilo que queríamos?

    Ainda volto para expor melhor minhas dúvidas e ignorância sobre este assunto que me despertou muito interesse. Gostaria de entender melhor.

    Por enquanto, thanks much!

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  10. Ei Udi,
    ótimo comentário esse seu. É isso mesmo: o que pode estar errado numa lei de anistia? É ou não é pra "esquecer"; anistiar?

    É verdade, também participei da campanha pró-anistia e não me sinto à vontade tendo gente como Vannuchi e Genro como "herdeiros" daquela luta e donos dessa bandeira.

    Vou escrever mais um textinho sobre o assunto hoje. Aguardo seu sempre bem vindo comentário.

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  11. "Anistia = perdão geral
    Ato pelo qual o poder público declara impuníveis, por motivo de utilidade social, todos quantos, até certo dia, perpetraram determinados delitos, em geral políticos, seja fazendo cessar as diligências persecutórias, seja tornando nulas e de nenhum efeito as condenações."

    A nova lei (sem a ter lido) mais parece alguém que deu um presente e agora resolve que quer de volta... (simplisticamente falando!)

    Êta gentinha complicada esses políticos!!!!!!!!!!!!!!!!!!

    And BTW, FÉRIAS simmmmmmmmmmm. O lugar (a foto que publiquei) pode ser paradisíaco e a lagoa dos patos é realmente linda, mas estou precisando SAIR, rir, não ter o que fazer se não botar os assuntos em dia, etc. RELAXAR...
    Vou sexta...

    Beijão :-)
    Anne

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  12. Ei Anne,
    nada como ter uma professora de línguas a nos ajudar... rss

    Querida, boas férias!

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  13. Obrigada rm... tirarei fotos. Vou lá pra terras da minha infância - Montevidéu - que adoro...

    E provavelmente andarei pela cibercultura, se bem que com menor frequência :-)

    Bjos
    Anne

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  14. aiaiai
    Vlw pelos comentarios esclarecendo o que foi a anistia uhauha
    me ajudaram muito com o trabalho que estou fazendo de história
    brigada ; )

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